Uma amiga me mostrou este artigo da Prof.a Mirian Goldenberg sobre o império do cor-de-rosa na vida das meninas. Não sei quem observa, mas me sinto nauseada com os sentidos embutidos na imposição desse mundo monocromático às meninas. Elas são princesas, elas tem que estar arrumadinhas, devem ser vistas e admiradas, e elas todas vestem rosa. E isso não é natural. Quem compra as primeiras roupinhas? Quem entope essas meninas de artigos cor-de-rosa? O que significa pois ser menina nesse mundo de uma cor só? E os meninos, por que têm quase todo o arco-íris para si? Menos o rosa, talvez...
Quando eu era criança tinha pouquíssima coisa cor-de-rosa. Minha mãe amava vermelho, minha cor favorita era azul, a do meu irmão era amarelo. As pessoas pensavam que o que era meu era dele e vice-versa. Hoje, em um ajuntamento de menininhas, praticamente todas estarão de rosa. É monótono e opressivo. E o problema não é gostar de rosa, hoje eu gosto de rosa, mas é essa cultura de domesticidade que a cor está evocando e reforçando. Mas leiam o texto, ele é muito melhor do que a minha falação.
Quando eu era criança tinha pouquíssima coisa cor-de-rosa. Minha mãe amava vermelho, minha cor favorita era azul, a do meu irmão era amarelo. As pessoas pensavam que o que era meu era dele e vice-versa. Hoje, em um ajuntamento de menininhas, praticamente todas estarão de rosa. É monótono e opressivo. E o problema não é gostar de rosa, hoje eu gosto de rosa, mas é essa cultura de domesticidade que a cor está evocando e reforçando. Mas leiam o texto, ele é muito melhor do que a minha falação.
A volta do cor-de-rosa
Mirian Goldenberg *, Jornal do Brasil
RIO - Aos domingos, gosto de caminhar na orla das praias de Ipanema e Leblon observando os corpos dos cariocas. O que estes corpos falam sobre uma cultura em que o corpo é um verdadeiro capital?
Com essa ideia na cabeça, e um papel e uma caneta na mão, tento decifrar que tipo de cultura está representada nos corpos observados. Nestas caminhadas antropológicas, o que mais me chama a atenção é a monocromia que reina nas roupas e acessórios das meninas. Quase todas estão de cor-de-rosa, da cabeça aos pés. O rosa não é apenas a cor das Barbies (cujo site tem como slogan Viva o rosa!) mas também dos vestidinhos, camisetinhas, bermudinhas, calcinhas, biquininhos, bolsinhas, sapatinhos, meinhas, enfeitinhos, lacinhos, pulseirinhas etc. Além do rosa, chama a atenção o excesso do uso do diminutivo das mães quando falam com e de suas filhas.
Comentando, tempos atrás, este fenômeno monocromático com a minha editora Ana Paula Costa, ela, muito empolgada, sugeriu que eu escrevesse um livro com o título: A volta do cor-de-rosa. A ideia seria a de retratar o fenômeno de uma nova geração de meninas extremamente românticas, melosas e açucaradas. Meninas cor-de-rosa. Chegamos à conclusão de que o rosa representa um modelo feminino que parecia ter sido completamente abolido nos anos 70 pelas mulheres que desejavam ser meio Leila Diniz: livres, fortes, poderosas, sexualmente ativas, donas do próprio corpo.
Nas minhas caminhadas percebo que, enquanto as meninas estão de rosa da cabeça aos pés, os meninos vestem roupas azuis, verdes, amarelas, vermelhas, cinzas, marrons, pretas, roxas, laranjas, lilás, brancas etc e até, algumas vezes, rosas. E eles não são apenas mais livres nas cores que usam mas, também, correm, brincam, gritam, jogam, se sujam e se machucam muito mais do que elas.
A comparação entre as cores e as brincadeiras de meninos e meninas sugere que faltará a elas, quando mulheres, algo fundamental: liberdade. Liberdade que, na minha pesquisa com indivíduos das camadas médias cariocas, elas afirmam invejar nos homens. Enquanto eles dizem que não invejam nada nas mulheres.
Quando brincam de casinha com suas Barbies cor-de-rosa, as meninas estão aprendendo a ser um tipo de mulher que, provavelmente, terá o mesmo tipo de sonho em um futuro não tão distante. Elas estão aprendendo a ser românticas, dependentes, delicadas, preocupadas com a aparência, mulheres que gastarão inúmeras horas em salão de beleza pintando as unhas do pé e da mão de rosa, comprando roupas e sapatos, cremes e maquiagens, obcecadas com dietas para emagrecer, com cirurgias plásticas, botox, e que, apesar de adultas, continuarão tendo fantasias com o príncipe encantado, que pagará as contas e resolverá todos os problemas.
Muitos pesquisadores já analisaram esta nova/velha mulher que, cansada do mundo competitivo do trabalho e das responsabilidades sociais, sonha em “voltar para a casa e se dedicar ao marido e aos filhos”. Sonho cada vez mais difícil de realizar e, talvez por isso mesmo, cada vez mais presente entre as brasileiras, uma espécie de nostalgia de um tempo perdido em que o papel feminino estava restrito ao de esposa e mãe.
Recentemente, descobri o blog PinkStinks (Rosa é uma droga), em que duas mães inglesas declararam guerra ao que chamam de pinkification (rosificação) das meninas: a onipresença da cor rosa no universo feminino. Elas acreditam, como eu, que o fenômeno vai muito além da cor. O site diz que a cultura do rosa, imposta às meninas desde o berço, é baseada no culto da beleza, no corpo, na aparência, na magreza, em detrimento da inteligência. Apesar de parecer inofensiva, continua, o rosa simboliza uma cultura de celebridade, fama e riqueza, obcecada pela imagem, que pode aprisionar e limitar as aspirações das meninas sobre o que podem ser e realizar quando se tornarem mulheres.
Se o corpo e a roupa falam algo sobre a nossa cultura, o que o rosa está falando sobre estas futuras mulheres? Estaria falando de um tipo de representação de gênero que associa a mulher à delicadeza, doçura, fragilidade, fraqueza, inferioridade, submissão? De mulheres cujo principal objetivo é conquistar um marido? De mulheres dependentes que precisam da proteção de homens fortes e poderosos? Estaria falando da clássica dominação masculina, que transforma meninas em mulheres cor-de-rosa?
Mirian Goldenberg *, Jornal do Brasil
RIO - Aos domingos, gosto de caminhar na orla das praias de Ipanema e Leblon observando os corpos dos cariocas. O que estes corpos falam sobre uma cultura em que o corpo é um verdadeiro capital?
Com essa ideia na cabeça, e um papel e uma caneta na mão, tento decifrar que tipo de cultura está representada nos corpos observados. Nestas caminhadas antropológicas, o que mais me chama a atenção é a monocromia que reina nas roupas e acessórios das meninas. Quase todas estão de cor-de-rosa, da cabeça aos pés. O rosa não é apenas a cor das Barbies (cujo site tem como slogan Viva o rosa!) mas também dos vestidinhos, camisetinhas, bermudinhas, calcinhas, biquininhos, bolsinhas, sapatinhos, meinhas, enfeitinhos, lacinhos, pulseirinhas etc. Além do rosa, chama a atenção o excesso do uso do diminutivo das mães quando falam com e de suas filhas.
Comentando, tempos atrás, este fenômeno monocromático com a minha editora Ana Paula Costa, ela, muito empolgada, sugeriu que eu escrevesse um livro com o título: A volta do cor-de-rosa. A ideia seria a de retratar o fenômeno de uma nova geração de meninas extremamente românticas, melosas e açucaradas. Meninas cor-de-rosa. Chegamos à conclusão de que o rosa representa um modelo feminino que parecia ter sido completamente abolido nos anos 70 pelas mulheres que desejavam ser meio Leila Diniz: livres, fortes, poderosas, sexualmente ativas, donas do próprio corpo.
Nas minhas caminhadas percebo que, enquanto as meninas estão de rosa da cabeça aos pés, os meninos vestem roupas azuis, verdes, amarelas, vermelhas, cinzas, marrons, pretas, roxas, laranjas, lilás, brancas etc e até, algumas vezes, rosas. E eles não são apenas mais livres nas cores que usam mas, também, correm, brincam, gritam, jogam, se sujam e se machucam muito mais do que elas.
A comparação entre as cores e as brincadeiras de meninos e meninas sugere que faltará a elas, quando mulheres, algo fundamental: liberdade. Liberdade que, na minha pesquisa com indivíduos das camadas médias cariocas, elas afirmam invejar nos homens. Enquanto eles dizem que não invejam nada nas mulheres.
Quando brincam de casinha com suas Barbies cor-de-rosa, as meninas estão aprendendo a ser um tipo de mulher que, provavelmente, terá o mesmo tipo de sonho em um futuro não tão distante. Elas estão aprendendo a ser românticas, dependentes, delicadas, preocupadas com a aparência, mulheres que gastarão inúmeras horas em salão de beleza pintando as unhas do pé e da mão de rosa, comprando roupas e sapatos, cremes e maquiagens, obcecadas com dietas para emagrecer, com cirurgias plásticas, botox, e que, apesar de adultas, continuarão tendo fantasias com o príncipe encantado, que pagará as contas e resolverá todos os problemas.
Muitos pesquisadores já analisaram esta nova/velha mulher que, cansada do mundo competitivo do trabalho e das responsabilidades sociais, sonha em “voltar para a casa e se dedicar ao marido e aos filhos”. Sonho cada vez mais difícil de realizar e, talvez por isso mesmo, cada vez mais presente entre as brasileiras, uma espécie de nostalgia de um tempo perdido em que o papel feminino estava restrito ao de esposa e mãe.
Recentemente, descobri o blog PinkStinks (Rosa é uma droga), em que duas mães inglesas declararam guerra ao que chamam de pinkification (rosificação) das meninas: a onipresença da cor rosa no universo feminino. Elas acreditam, como eu, que o fenômeno vai muito além da cor. O site diz que a cultura do rosa, imposta às meninas desde o berço, é baseada no culto da beleza, no corpo, na aparência, na magreza, em detrimento da inteligência. Apesar de parecer inofensiva, continua, o rosa simboliza uma cultura de celebridade, fama e riqueza, obcecada pela imagem, que pode aprisionar e limitar as aspirações das meninas sobre o que podem ser e realizar quando se tornarem mulheres.
Se o corpo e a roupa falam algo sobre a nossa cultura, o que o rosa está falando sobre estas futuras mulheres? Estaria falando de um tipo de representação de gênero que associa a mulher à delicadeza, doçura, fragilidade, fraqueza, inferioridade, submissão? De mulheres cujo principal objetivo é conquistar um marido? De mulheres dependentes que precisam da proteção de homens fortes e poderosos? Estaria falando da clássica dominação masculina, que transforma meninas em mulheres cor-de-rosa?
* Mirian Goldenberg é antropóloga, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro e autora de 'Toda mulher é meio Leila Diniz' (Ed. BestBolso). 17:20 - 09/01/2010
Valéria querida, adorei seu comentário sobre a homofobia nas igrejas evangélicas, que vc deixou no meu blog. Posso deletá-lo e transformá-lo em guest post? É que está muito esclarecedor, principalmente quando vc fala da divisão dos preconceitos entre católicos e evangélicos.
ResponderExcluirNão sabia que vc estava com este blog! Que ótimo! Eu só conhecia o Shoujo Café. Agora vou acompanhar. Abração e obrigada pelo excelente comentário!
Este comentário foi removido pelo autor.
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ResponderExcluirConcordo, artigo perfeito!
ResponderExcluirOioi! Primeira vez aqui, estou adorando e já te linkei!
ResponderExcluirOlha só, graças a Deus meus pais não tinham frescuras na minha Educação. Eu era uma menina bem moleca, que adorava usar Ki-Chute e camisa de futebol, e sempre preferi mil vezes os brinquedos "de meninos". E ODIAVA usar vestidos e frufrus nos cabelos (que quase sempre eram bem curtinhos). Meu brinquedo preferido era minha coleção de carrinhos em miniatura.
Meu irmão mais novo, por outro lado, adorava bonecas e brincar de casinha, e ninguém fazia drama por isso.Pelo contrário, meus pais diziam q a infância era uma dádiva e deveria-se brincar de tudo!
Acho a maior cretinice dividir brinquedos e brincadeiras por gênero. Como se mulher não tivesse carro e homem não tivesse filhos...
Meu filho, hj com 13 anos, já ganhou até boneca de aniversário (dada por mim e minha mãe), e ele adorava, aos 4, 5 anos de idade.
O duro é lidar com o preconceito e a mente extremamente fechada e medíocre das pessoas...